sexta-feira, 22 de julho de 2011


Idílio

Quando nós vamos ambos, de mãos dadas,
Colher nos vales lírios e boninas,
E galgamos dum fôlego as colinas
Dos rocios da noite inda orvalhadas;

Ou, vendo o mar das ermas cumeadas
Contemplamos as nuvens vespertinas,
Que parecem fantásticas ruínas
Ao longo, no horizonte, amontoadas:

Quantas vezes, de súbito, emudeces!
Não sei que luz no teu olhar flutua;
Sinto tremer-te a mão e empalideces

O vento e o mar murmuram orações,
E a poesia das coisas se insinua
Lenta e amorosa em nossos corações.

Antero de Quental

quarta-feira, 20 de julho de 2011


Ternura

Desvio dos teus ombros o lençol, 
que é feito de ternura amarrotada, 
da frescura que vem depois do sol, 
quando depois do sol não vem mais nada... 

Olho a roupa no chão: que tempestade! 
Há restos de ternura pelo meio, 
como vultos perdidos na cidade 
onde uma tempestade sobreveio... 

Começas a vestir-te, lentamente, 
e é ternura também que vou vestindo, 
para enfrentar lá fora aquela gente 
que da nossa ternura anda sorrindo... 

Mas ninguém sonha a pressa com que nós 
a despimos assim que estamos sós! 

David Mourão-Ferreira

sexta-feira, 15 de julho de 2011


Quando penso em você me sinto flutuar,
me sinto alcançar as nuvens,
tocar as estrelas, morar no céu...

Tento apenas superar
a imensa saudade que me arrasa o coração,
mas, que vem junto com as doces lembranças do teu ser. 

Lembrando dos momentos
em que juntos nosso amor se conjugava
em uma só pessoa, nós ...


É através desse tal sentimento, a saudade,
que sobrevivo quando estou longe de você.
Ela é o alimento do amor que encontra-se distante...


A delicadeza de tuas palavras
contrasta com a imensidão do teu sentimento.
Meu ciúme se abranda com tuas juras
e promessas de amor eterno.


A longa distância apenas serve para unir o nosso amor.
A saudade serve para me dar
a absoluta certeza de que ficaremos para sempre unidos...


E nesse momento de saudade,
quando penso em você,
quando tudo está machucando o meu coração
e acho que não tenho mais forças para continuar;
eis que surge tua doce presença,
com o esplendor de um anjo;
e me envolvendo como uma suave brisa aconchegante...
Tudo isso acontece porque amo e penso em você...

William Shakespeare

segunda-feira, 11 de julho de 2011


El beso

Se iluminó la estancia de una venusta gracia
cuando acerqué a tu boca la mía temblorosa,
mientras por tierra y cielo relampagueó mi audacia
cortándole a la vida su más intacta rosa.

¿Qué jugo, di, qué jugo el corazón invoca
tiene como tus labios tan íntimos dulzores?
Mujer, dime: ¿Qué abejas buscaron en qué flores
las mieles trasegadas al panal de tu boca?

¡Oh, beso! con la gloria de tu emoción celeste
-comunión de alma y boca, brasa y diafanidad-
abriste en el más puro de los espasmos: Este,
a nuestro barro efímero rutas de eternidad.

Tu labio, jardín donde la fiebre es jardinera;
botón de calentura mi labio nunca ahíto,
fundiéronse en las llagas de la inmortal hoguera
para beberse juntos de un beso el infinito.

FLAVIO HERRERA

domingo, 10 de julho de 2011



TU RISA

Quítame el pan, si quieres, 
quítame el aire, pero 
no me quites tu risa.

No me quites la rosa, 
la lanza que desgranas, 
el agua que de pronto 
estalla en tu alegría, 
la repentina ola 
de plata que te nace.

Mi lucha es dura y vuelvo 
con los ojos cansados 
a veces de haber visto 
la tierra que no cambia, 
pero al entrar tu risa 
sube al cielo buscándome 
y abre para mi todas 
las puertas de la vida.

Amor mío, en la hora 
más oscura desgrana
tu risa, y si de pronto 
ves que mi sangre mancha 
las piedras de la calle, 
ríe, porque tu risa 
será para mis manos 
como una espada fresca.

Junto al mar en otoño, 
tu risa debe alzar 
su cascada de espuma, 
y en primavera, amor, 
quiero tu risa como 
la flor que yo esperaba, 
la flor azul, la rosa 
de mi patria sonora.

Ríete de la noche, 
del día, de la luna, 
ríete de las calles 
torcidas de la isla, 
ríete de este torpe 
muchacho que te quiere, 
pero cuando yo abro 
los ojos y los cierro, 
cuando mis pasos van, 
cuando vuelven mis pasos, 
niégame el pan, el aire, 
la luz, la primavera, 
pero tu risa nunca 
porque me moriría.

Pablo Neruda

quinta-feira, 7 de julho de 2011


SONETO CV

Não chame o meu amor de Idolatria 
Nem de Ídolo realce a quem eu amo, 
Pois todo o meu cantar a um só se alia,
E de uma só maneira eu o proclamo. 
É hoje e sempre o meu amor galante, 
Inalterável, em grande excelência; 
Por isso a minha rima é tão constante
A uma só coisa e exclui a diferença. 
'Beleza, Bem, Verdade', eis o que exprimo; 
'Beleza, Bem, Verdade', todo o acento; 
E em tal mudança está tudo o que primo, 
Em um, três temas, de amplo movimento. 
'Beleza, Bem, Verdade' sós, outrora; 
Num mesmo ser vivem juntos agora.

William Shakespeare

segunda-feira, 4 de julho de 2011


O Amor

O amor, quando se revela, 
Não se sabe revelar. 
Sabe bem olhar pra ela, 
Mas não lhe sabe falar. 

Quem quer dizer o que sente 
Não sabe o que há de dizer. 
Fala: parece que mente 
Cala: parece esquecer 

Ah, mas se ela adivinhasse, 
Se pudesse ouvir o olhar, 
E se um olhar lhe bastasse 
Pr'a saber que a estão a amar! 

Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente 
Fica sem alma nem fala, 
Fica só, inteiramente! 

Mas se isto puder contar-lhe 
O que não lhe ouso contar, 
Já não terei que falar-lhe 
Porque lhe estou a falar...

Fernando Pessoa

Um Poema de Amor

Não sei onde estás, 
se falas ou se apenas olhas o horizonte,
que pode ser apenas 
o de uma parede de quarto. 
Mas sei que uma sombra 
se demora contigo, 
quando me pergunto onde estás: 
uma inquietação que atravessa 
o espaço entre mim e ti, 
e te rouba as certezas de hoje, 
como a mim me dá este poema. 

Nuno Júdice

quinta-feira, 30 de junho de 2011


Amar é Pensar

Passei toda a noite, sem dormir, vendo, sem espaço, a figura dela, 
E vendo-a sempre de maneiras diferentes do que a encontro a ela. 
Faço pensamentos com a recordação do que ela é quando me fala, 
E em cada pensamento ela varia de acordo com a sua semelhança. 
Amar é pensar. 
E eu quase que me esqueço de sentir só de pensar nela. 
Não sei bem o que quero, mesmo dela, e eu não penso senão nela. 
Tenho uma grande distração animada. 
Quando desejo encontrá-la 
Quase que prefiro não a encontrar, 
Para não ter que a deixar depois. 
Não sei bem o que quero, nem quero saber o que quero. 
Quero só Pensar nela. 
Não peço nada a ninguém, nem a ela, senão pensar. 

Fernando Pessoa (Alberto Caeiro)

segunda-feira, 27 de junho de 2011


Ideal

Aquela, que eu adoro, não é feita 
De lírios nem de rosas purpurinas, 
Não tem as formas languidas, divinas 
Da antiga Vénus de cintura estreita... 

Não é a Circe, cuja mão suspeita 
Compõe filtros mortaes entre ruinas, 
Nem a Amazona, que se agarra ás crinas 
D'um corcel e combate satisfeita... 

A mim mesmo pergunto, e não atino 
Com o nome que dê a essa visão, 
Que ora amostra ora esconde o meu destino... 

É como uma miragem, que entrevejo, 
Ideal, que nasceu na solidão, 
Nuvem, sonho impalpável do Desejo... 

Antero de Quental

sexta-feira, 24 de junho de 2011


Devo-te

Devo-te tanto como um pássaro 
deve o seu voo à lavada 
planície do céu. 

Devo-te a forma 
novíssima de olhar 
teu corpo onde às vezes 
desce o pudor o silêncio 
de uma pálpebra mais nada. 

Devo-te o ritmo 
de peixe na palavra, 
a genesíaca, doce 
violência dos sentidos; 
esta tinta de sol 
sobre o papel de silêncio 
das coisas - estes versos 
doces, curtos, de abelhas 
transportando o pólen 
levíssimo do dia; 
estas formigas na sombra 
da própria pressa e entrando 
todas em fila no tempo: 
com uma pergunta frágil 
nas antenas, um recado invisível, o peso 
que as deixa ser e esquece; 
e a tua voz que compunha 
uma casa, uma rosa 
a toda a volta - ó meu amor vieste 
rasgar um sol das minhas mãos! 

Vítor Matos e Sá

quinta-feira, 23 de junho de 2011


Soneto LII

Cantas y a sol y a cielo con tu canto
tu voz desgrana el cereal del día,
hablan los pinos con su lengua verde:
trinan todas las aves del invierno.
El mar llena sus sótanos de pasos,
de campanas, cadenas y gemidos,
tintinean metales y utensilios,
suenan las ruedas de la caravana.
Pero sólo tu voz escucho y sube
tu voz con vuelo y precisión de flecha,
baja tu voz con gravedad de lluvia,
tu voz esparce altísimas espadas,
vuelve tu voz cargada de violetas
y luego me acompaña por el cielo.

Pablo Neruda

quarta-feira, 22 de junho de 2011


A ti

Al calor de tu forma progresa mi sangre, 
en el aire 
de sueño
el clima para lo solo eres tú
-una sombra canta para ti en el fondo del agua 
al 
compás de mi corazón
y en tu mirar mis ojos están silenciosos 
por la música 
al soplo de la luz,
en el cielo y en la oscuridad.

Esta noche reuno tu forma,
el eco de tu boca en medio de una olvidada canción
-y te doy un abrazo.

Jaime Saenz

segunda-feira, 20 de junho de 2011


Amar Teus Olhos

Podia com teus olhos 
escrever a palavra mar. 
Podia com teus olhos 
escrever a palavra amar 
não fossem amor já teus olhos. 

Podia em teus olhos navegar 
conjugar os verbos dar e receber. 
Podia com teus olhos 
escrever o verbo semear 
e ser tua pele 
a terra de nascer poema. 

Podia com teus olhos escrever 
a palavra além ou aqui 
ou a palavra luar, 
recolher-me em teus olhos de lua 
só teus olhos amar. 

Podia em teus olhos perder-me 
não fossem, amor, teus olhos, 
o tempo de achar-me. 

Carlos Melo Santos

quarta-feira, 15 de junho de 2011



Beijo

sua boca
uva rubra
roça meus lábios
e por segundos
somos murmúrios úmidos
seiva cósmica
de línguas
púrpuras

Virgínia Schall

terça-feira, 14 de junho de 2011


Fumo

Longe de ti são ermos os caminhos, 
Longe de ti não há luar nem rosas; 
Longe de ti há noites silenciosas, 
Há dias sem calor, beirais sem ninhos! 

Meus olhos são dois velhos pobrezinhos 
Perdidos pelas noites invernosas... 
Abertos, sonham mãos cariciosas, 
Tuas mãos doces plenas de carinhos! 

Os dias são Outonos: choram... choram... 
Há crisântemos roxos que descoram... 
Há murmúrios dolentes de segredos... 

Invoco o nosso sonho! Estendo os braços! 
E ele é, ó meu amor pelos espaços, 
Fumo leve que foge entre os meus dedos... 

Florbela Espanca

segunda-feira, 13 de junho de 2011



Amor

o teu rosto à minha espera, o teu rosto 
a sorrir para os meus olhos, existe um 
trovão de céu sobre a montanha. 

as tuas mãos são finas e claras, vês-me 
sorrir, brisas incendeiam o mundo, 
respiro a luz sobre as folhas da olaia. 

entro nos corredores de outubro para 
encontrar um abraço nos teus olhos, 
este dia será sempre hoje na memória. 

hoje compreendo os rios. a idade das 
rochas diz-me palavras profundas, 
hoje tenho o teu rosto dentro de mim. 

José Luís Peixoto

sexta-feira, 10 de junho de 2011



EN TU CUERPO

¿Por qué no soy yo tu cuerpo
sobre mi cuerpo desnudo
para abrazarme a mi tronco
y sentir que soy yo mismo
ascendiendo por mis muslos?

¿Por qué no soy yo tus ojos
para mirarme los míos
y decirme con miradas
lo que al mirarte te digo?

¿Por qué no soy yo tu boca
para besarme en el fuego
que se despierta en mis labios,
y al besarme desde ti
sentir la verdad del beso?

¿Por qué no soy yo tus manos
para jugar con las mías
haciendo idilio de tactos
y sentir que me acaricio
con tus yemas encendidas?

¿Por qué no soy yo tu vida
para sentir lo que siento
desde tu propia existencia
y sufrir en tu cerebro
el dolor del pensamiento?

Quisiera ser vaso y vino,
las raíces y las ramas,
la ribera y la corriente,
la campana y el sonido,
el combustible y la llama.

Sigue durmiendo sin verme
que yo, despierto, a tu lado,
vuelo al vuelo de tu sueño,
y estoy tan cerca de ti
que respiro por tu cuerpo.

Elías Nandino

quinta-feira, 9 de junho de 2011


Quem és tu

Quem és tu que assim vens pela noite adiante,
Pisando o luar branco dos caminhos,
Sob o rumor das folhas inspiradas?

A perfeição nasce do eco dos teus passos,
E a tua presença acorda a plenitude
A que as coisas tinham sido destinadas.

A história da noite é o gesto dos teus braços,
O ardor do vento a tua juventude,
E o teu andar é a beleza das estradas.

Sophia Andresen

segunda-feira, 6 de junho de 2011


BELLA

Bella, 
como en la piedra fresca
del manantial, el agua 
abre un ancho relámpago de espuma, 
así es la sonrisa en tu rostro, 
bella.

Bella, 
de finas manos y delgados pies
como un caballito de plata, 
andando, flor del mundo, 
así te veo, 
bella.

Bella, 
con un nido de cobre enmarañado
en tu cabeza, un nido 
color de miel sombría 
donde mi corazón arde y reposa, 
bella.

Bella,
no te caben los ojos en la cara,
no te caben los ojos en la tierra. 
Hay países, hay ríos 
en tus ojos, 
mi patria está en tus ojos, 
yo camino por ellos, 
ellos dan luz al mundo 
por donde yo camino, 
bella.

Bella, 
tus senos son como dos panes hechos
de tierra cereal y luna de oro, 
bella.

Bella, 
tu cintura
la hizo mi brazo como un río cuando 
pasó mil años por tu dulce cuerpo, 
bella.

Bella, 
no hay nada como tus caderas, 
tal vez la tierra tiene 
en algún sitio oculto 
la curva y el aroma de tu cuerpo, 
tal vez en algún sitio, 
bella.

Bella, mi bella,
tu voz, tu piel, tus uñas,
bella, mi bella, 
tu ser, tu luz, tu sombra, 
bella, 
todo eso es mío, bella, 
todo eso es mío, mía, 
cuando andas o reposas, 
cuando cantas o duermes, 
cuando sufres o sueñas, 
siempre, 
cuando estás cerca o lejos, 
siempre, 
eres mía, mi bella, 
siempre.

Pablo Neruda

O CRESCIMENTO DO AMOR, 
OU A PRIMAVERA

Mal acredito que o meu amor seja tão puro
Como pensava que era,
Porque tem que suportar
Vicissitudes, e estações, como a erva.
Penso que menti todo o inverno, quando jurava
Meu amor infinito, se a Primavera o aumentou.

Mas, se o amor, este remédio, que toda a mágoa cura
Com mais, não for qualquer quintessência, é mistura
De todas as matérias afligindo a alma, ou os sentidos,
E ao Sol rouba o seu vigor operativo.
O Amor não é tão puro e abstrato, como costumam
Dizer os que por amantes têm a sua Musa,
Mas como tudo o resto, sendo também elemental,
Por vezes será contemplativo, outras agirá.

Mas nem por isso maior, apenas mais eminente
Se tornou, com a Primavera,
Como, no firmamento,
Com o Sol, as estrelas, se mostram mas não aumentam.
Como botões num ramo, ternos gestos amorosos,
Da despertada raiz do amor florescem agora.

Se, no agitar da água mais círculos procedem
de um, também assim o amor se acrescentará.
Esses, iguais às tantas esferas, apenas um céu formam,
Porque todos são concêntricos em ti:
Cada Primavera acrescentará novo calor ao amor, e
Como os príncipes em tempo de guerra, que lançam
Novos impostos sem depois os revogar na paz,
Nenhum Inverno diminuirá o acrescento da Primavera.

John Donne

sexta-feira, 3 de junho de 2011


O Amor É uma Companhia

O amor é uma companhia. 
Já não sei andar só pelos caminhos, 
Porque já não posso andar só. 
Um pensamento visível faz-me andar mais depressa 
E ver menos, e ao mesmo tempo gostar bem de ir vendo tudo. 
Mesmo a ausência dela é uma coisa que está comigo. 
E eu gosto tanto dela que não sei como a desejar. 

Se a não vejo, imagino-a e sou forte como as árvores altas. 
Mas se a vejo tremo, não sei o que é feito do que sinto na ausência dela. 
Todo eu sou qualquer força que me abandona. 
Toda a realidade olha para mim como um girassol com a cara dela no meio. 

Fernando Pessoa (Alberto Caeiro)

quarta-feira, 1 de junho de 2011


Em Todas as Ruas te Encontro

Em todas as ruas te encontro 
em todas as ruas te perco 
conheço tão bem o teu corpo 
sonhei tanto a tua figura 
que é de olhos fechados que eu ando 
a limitar a tua altura 
e bebo a água e sorvo o ar 
que te atravessou a cintura 
tanto tão perto tão real 
que o meu corpo se transfigura 
e toca o seu próprio elemento 
num corpo que já não é seu 
num rio que desapareceu 
onde um braço teu me procura 

Em todas as ruas te encontro 
em todas as ruas te perco 

Mário Cesariny

segunda-feira, 30 de maio de 2011


Nas Águas 
Vosso Amor Ponde

A palavra que te disse, 
talvez por ser tão pequena, 
em tais desprezos perdeu-se 
que não deixou nem pena. 

Murmurei-a a uma cisterna 
de turvas águas antigas 
e foi-se de cova em cova 
em múltiplas cantigas. 

Amadores deste mundo, 
nas águas vosso amor ponde; 
que elas vos darão resposta, 
quando ninguém responde. 

Cecília Meireles

quinta-feira, 26 de maio de 2011


Se às Vezes Digo 
que as Flores Sorriem

Se às vezes digo que as flores sorriem 
E se eu disser que os rios cantam, 
Não é porque eu julgue que há sorrisos nas flores 
E cantos no correr dos rios... 
É porque assim faço mais sentir aos homens falsos 
A existência verdadeiramente real das flores e dos rios. 
Porque escrevo para eles me lerem sacrifico-me às vezes 
À sua estupidez de sentidos... 
Não concordo comigo mas absolvo-me, 
Porque só sou essa cousa séria, um intérprete da Natureza, 
Porque há homens que não percebem a sua linguagem, 
Por ela não ser linguagem nenhuma. 

Fernando Pessoa (Alberto Caeiro)