sexta-feira, 13 de maio de 2011


O Sonho

Amor querido, por nada menos que tu 
Teria eu interrompido este sonho feliz: 
Era um tema 
Para a razão, demasiado forte para fantasia. 
Portanto, sabiamente, me acordaste; porém 
O meu sonho não terminou, continuou contigo. 
És tão verdadeira que bastam os pensamentos de ti 
Para tornar sonhos realidade, fábulas em história. 
Vem a meus braços, pois se pensaste ser melhor 
Que não sonhasse todo o meu sonho, concretizemos o resto. 

Como o relâmpago, ou a luz da vela, 
Teus olhos, e não o teu ruído, me acordaram; 
Porém pensei que eras 
(Tu que amas a verdade) um Anjo — à primeira vista. 
Mas quando vi que vias o meu coração 
E os meus pensamentos, para além da arte do anjo, 
Como sabias do meu sonho, como sabias quando 
O excesso de gozo me acordaria, e então vieste, 
Devo confessar que no mínimo, seria 
Ultrajante, pensar-te outra coisa que não tu. 

Vindo e ficando mostrou-me que tu és tu. 
Mas o levantares-te faz-me duvidar, e temo agora 
Que tu já não sejas tu. 
E fraco o amor quando o medo é tão forte como ele; 
Não é todo espírito puro e corajoso 
Se mistura tem de medo, vergonha, ou honra. 
Talvez como os fachos que, já preparados, 
Os homens acendem e apagam, me trates tu: 
Vieste para inflamar, partiste para voltar. Então 
Sonharei esse desejo outra vez, senão desfaleceria. 

John Donne