segunda-feira, 2 de maio de 2011


Grita

Amor, quando chegares à minha fonte distante, 
cuida para que não me morda tua voz de ilusão: 
que minha dor obscura não morra nas tuas asas, 
nem se me afogue a voz em tua garganta de ouro. 

Quando chegares, Amor 
à minha fonte distante, 
sê chuva que estiola, 
sê baixo que rompe. 

Desfaz, Amor, o ritmo 
destas águas tranquilas: 
sabe ser a dor que estremece e que sofre, 
sabe ser a angústia que se grita e retorce. 

Não me dês o olvido. 
Não me dês a ilusão. 
Porque todas as folhas que na terra caíram 
me deixaram de ouro aceso o coração. 

Quando chegares, Amor 
à minha fonte distante, 
desvia-me as vertentes, 
aperta-me as entranhas. 

E uma destas tardes - Amor de mãos cruéis -, 
ajoelhado, eu te darei graças. 

Pablo Neruda