sexta-feira, 14 de setembro de 2012


Soneto LXXII

Amor mío, el invierno regresa a sus cuarteles,
establece la tierra sus dones amarillos
y pasamos la mano sobre un país remoto,
sobre la cabellera de la geografía.

Irnos! Hoy! Adelante, ruedas, naves, campanas,
aviones acerados por el diurno infinito
hacia el olor nupcial del archipiélago,
por longitudinales harinas de usufructo!

Vamos, levántate, y endiadémate y sube
y baja y corre y trina con el aire y conmigo
vámonos a los trenes de Arabia o Tocopilla,

sin más que trasmigrar hacia el polen lejano,
a pueblos lancinantes de harapos y gardenias
gobernados por pobres monarcas sin zapatos.

sexta-feira, 4 de maio de 2012



Balada de Sempre

Espero a tua vinda 
a tua vinda, 
em dia de lua cheia. 

Debruço-me sobre a noite 
a ver a lua a crescer, a crescer... 

Espero o momento da chegada 
com os cansaços e os ardores de todas as chegadas... 

Rasgarás nuvens de ruas densas, 
Alagarás vielas de bêbados transformadores. 
Saltarás ribeiros, mares, relevos... 
- A tua alma não morre 
aos medos e às sombras!- 

Mas..., 
Enquanto deixo a janela aberta 
para entrares, 
o mar, 
aí além, 
sempre duvidoso, 
desenha interrogações na areia molhada... 

Fernando Namora

domingo, 29 de abril de 2012


Nota Discordante

Porque razão sorri a Natureza à minha volta? 

Reparem na discordância... 

É como um grito de revolta 
que se solta 
por aí fora... 

... e não encontra obstáculo para o eco... 

Fernando Namora

sexta-feira, 20 de abril de 2012


A Tua Boca

A tua boca. A tua boca. 
Oh, também a tua boca. 
Um túnel para a minha noite. 
Um poço para a minha sede. 

Os fios dormentes de água 
que a tua língua solta num grito cor-de-rosa 
e a minha língua sorve e canta 
e os meus dentes mordem derramando a seiva 
da tua primavera sem palavras 
o poema inquieto e livre que a tua boca oferece 
à minha boca. 

As loucas bebedeiras de ternura 
por essa viagem até ao sangue. 
Os beijos como fogueiras. 
As línguas como rosas. 

Oh, a tua boca para a minha boca. 

Joaquim Pessoa

quarta-feira, 4 de abril de 2012


Quando não te Vejo Perco o Siso

Formosura do Céu a nós descida, 
Que nenhum coração deixas isento, 
Satisfazendo a todo pensamento, 
Sem que sejas de algum bem entendida; 

Qual língua pode haver tão atrevida, 
Que tenha de louvar-te atrevimento, 
Pois a parte melhor do entendimento, 
No menos que em ti há se vê perdida? 

Se em teu valor contemplo a menor parte, 
Vendo que abre na terra um paraíso, 
Logo o engenho me falta, o espírito míngua. 

Mas o que mais me impede inda louvar-te, 
É que quando te vejo perco a língua, 
E quando não te vejo perco o siso. 

Luís Vaz de Camões

sexta-feira, 16 de março de 2012


La infinita

Ves estas manos? Han medido 
la tierra, han separado
los minerales y los cereales, 
han hecho la paz y la guerra, 
han derribado las distancias 
de todos los mares y ríos, 
y sin embargo 
cuanto te recorren 
a ti, pequeña, 
grano de trigo, alondra, 
no alcanzan a abarcarte, 
se cansan alcanzando 
las palomas gemelas 
que reposan o vuelan en tu pecho, 
recorren las distancias de tus piernas, 
se enrollan en la luz de tu cintura. 
Para mí eres tesoro más cargado 
de inmensidad que el mar y su racimos 
y eres blanca y azul y extensa como 
la tierra en la vendimia. 
En ese territorio, 
de tus pies a tu frente,
andando, andando, andando, 
me pasaré la vida.

Pablo Neruda 

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012



Soneto XLIX

Es hoy: todo el ayer se fue cayendo
entre dedos de luz y ojos de sueño,
mañana llegará con pasos verdes:
nadie detiene el río de la aurora.

Nadie detiene el río de tus manos,
los ojos de tu sueño, bienamada,
eres temblor del tiempo que transcurre
entre luz vertical y sol sombrío,

y el cielo cierra sobre ti sus alas
llevándote y trayéndote a mis brazos
con puntual, misteriosa cortesía:

Por eso canto al día y a la luna,
al mar, al tiempo, a todos los planetas,
a tu voz diurna y a tu piel nocturna.

Pablo Neruda

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012


Destino

Quem disse à estrela o caminho
Que ela há-de seguir no céu?
A fabricar o seu ninho
Como é que a ave aprendeu?
Quem diz à planta: “Floresce!”
E ao mudo verme que tece
Sua mortalha de seda
Os fios quem lhos enreda?

Ensinou alguém à abelha
Que no prado anda a zumbir
Se à flor branca ou à vermelha
O seu mel há-de ir pedir?

Que eras tu meu ser, querida,
Teus olhos a minha vida,
Teu amor todo o meu bem…
Ai! não mo disse ninguém.
Como a abelha corre ao prado,
Como no céu gira a estrela,
Como a todo o ente o seu fado
Por instinto se revela,
Eu no teu seio divino
Vim cumprir o meu destino…
Vim, que em ti só sei viver,
Só por ti posso morrer.

Almeida Garret

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011


Um amor impossível

Amanhã
este fogo cresce.

Amanhã, tremor
Amanhã, suspiro.

Insiste
um amor impossível
amanhã.

Insiste,
sim.
Um amor impossível pode ser amanhã.

Angela Melim

terça-feira, 27 de dezembro de 2011


Todos los días descubro…

Según un poema de Fernando Pessoa

Todos los días descubro
La espantosa realidad de las cosas:
Cada cosa es lo que es.
Que difícil es decir esto y decir
Cuánto me alegra y como me basta.
Para ser completo existir es suficiente.

He escrito muchos poemas.
Claro, he de escribir otros más.
Cada poema mío dice lo mismo,
Cada poema mío es diferente,
Cada cosa es una manera distinta de decir lo mismo.

A veces miro una piedra.
No pienso que ella siente,
No me empeño en llamarla hermana.
Me gusta por ser piedra,
Me gusta porque no siente,
Me gusta porque no tiene parentesco conmigo.

Otras veces oigo pasar el viento:
Vale la pena haber nacido
Sólo por oír pasar el viento.

No sé qué pensarán los otros al leer esto
Creo que ha de ser bueno porque lo pienso sin esfuerzo;
Lo pienso sin pensar que otros me oyen pensar,
Lo pienso sin pensamientos,
Lo digo como lo dicen mis palabras.

Una vez me llamaron poeta materialista.
Y yo me sorprendí: nunca había pensado
Que pudiesen darme este o aquel nombre.
Ni siquiera soy poeta: veo.
Si vale lo que escribo, no es valer mío.
El valer está ahí, en mis versos.
Todo esto es absolutamente independiente de mi voluntad.

Octavio Paz

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011


Besos

Hay besos que pronuncian por sí solos
la sentencia de amor condenatoria,
hay besos que se dan con la mirada
hay besos que se dan con la memoria.

Hay besos silenciosos, besos nobles
hay besos enigmáticos, sinceros
hay besos que se dan sólo las almas
hay besos por prohibidos, verdaderos.

Hay besos que calcinan y que hieren,
hay besos que arrebatan los sentidos,
hay besos misteriosos que han dejado
mil sueños errantes y perdidos.

Hay besos problemáticos que encierran
una clave que nadie ha descifrado,
hay besos que engendran la tragedia
cuantas rosas en broche han deshojado.

Hay besos perfumados, besos tibios
que palpitan en íntimos anhelos,
hay besos que en los labios dejan huellas
como un campo de sol entre dos hielos.

Hay besos que parecen azucenas
por sublimes, ingenuos y por puros,
hay besos traicioneros y cobardes,
hay besos maldecidos y perjuros.

Judas besa a Jesús y deja impresa
en su rostro de Dios, la felonía,
mientras la Magdalena con sus besos
fortifica piadosa su agonía.

Desde entonces en los besos palpita
el amor, la traición y los dolores,
en las bodas humanas se parecen
a la brisa que juega con las flores.

Hay besos que producen desvaríos
de amorosa pasión ardiente y loca,
tú los conoces bien son besos míos
inventados por mí, para tu boca.

Besos de llama que en rastro impreso
llevan los surcos de un amor vedado,
besos de tempestad, salvajes besos
que solo nuestros labios han probado.

¿Te acuerdas del primero...? Indefinible;
cubrió tu faz de cárdenos sonrojos
y en los espasmos de emoción terrible,
llenaron sé de lágrimas tus ojos.

¿Te acuerdas que una tarde en loco exceso
te vi celoso imaginando agravios,
te suspendí en mis brazos... vibró un beso,
y qué viste después...? Sangre en mis labios.

Yo te enseñe a besar: los besos fríos
son de impasible corazón de roca,
yo te enseñé a besar con besos míos
inventados por mí, para tu boca.

Gabriela Mistral

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011


Certas Palavras

Certas palavras não podem ser ditas 
em qualquer lugar e hora qualquer. 
Estritamente reservadas 
para companheiros de confiança, 
devem ser sacralmente pronunciadas 
em tom muito especial 
lá onde a polícia dos adultos 
não adivinha nem alcança. 

Entretanto são palavras simples: 
definem 
partes do corpo, movimentos, actos 
do viver que só os grandes se permitem 
e a nós é defendido por sentença 
dos séculos. 

E tudo é proibido. Então, falamos. 

Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011



O Dom Milagroso 
de um Grande Amor

Na vida de toda a gente há braçados floridos dessas tolices sem importância. Só a raros eleitos é dado o milagroso dom de um grande amor. Eu teria muita pena que o destino não me trouxesse esse grande amor que foi o meu grande sonho pela vida fora. Devo agradecer ao destino o favor de ter ouvido a minha voz. Pôr finalmente, no meu caminho, a linda alma nova, ardente e carinhosa que é todo o meu ampa­ro, toda a minha riqueza, toda a minha felicidade neste mundo. A morte pode vir quando quiser: trago as mãos cheias de rosas e o coração em festa: posso partir contente. 

Florbela Espanca

sábado, 10 de dezembro de 2011



O Amor não Tem nada que Ver 
com a Idade

Penso saber que o amor não tem nada que ver com a idade, como acontece com qualquer outro sentimento. Quando se fala de uma época a que se chamaria de descoberta do amor, eu penso que essa é uma maneira redutora de ver as relações entre as pessoas vivas. O que acontece é que há toda uma história nem sempre feliz do amor que faz que seja entendido que o amor numa certa idade seja natural, e que noutra idade extrema poderia ser ridículo. Isso é uma ideia que ofende a disponibilidade de entrega de uma pessoa a outra, que é em que consiste o amor. 

Eu não digo isto por ter a minha idade e a relação de amor que vivo. Aprendi que o sentimento do amor não é mais nem menos forte conforme as idades, o amor é uma possibilidade de uma vida inteira, e se acontece, há que recebê-lo. Normalmente, quem tem ideias que não vão neste sentido, e que tendem a menosprezar o amor como factor de realização total e pessoal, são aqueles que não tiveram o privilégio de vivê-lo, aqueles a quem não aconteceu esse mistério. 

José Saramago

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011



A Mulher que Passa

Meu Deus, eu quero a mulher que passa. 
Seu dorso frio é um campo de lírios 
Tem sete cores nos seus cabelos 
Sete esperanças na boca fresca! 

Oh! Como és linda, mulher que passas 
que me sacias e suplicias 
Dentro das noites, dentro dos dias! 

Teus sentimentos são poesia 
Teus sofrimentos, melancolia. 
Teus pêlos leves são relva boa 
Fresca e macia. 
Teus belos braços são cisnes mansos 
Longe das vozes da ventania. 

Meu Deus, eu quero a mulher que passa! 

Como te adoro, mulher que passas 
Que vens e passas, que me sacias 
Dentro das noites, dentro dos dias! 

Porque me faltas, se te procuro? 
Por que me odeias quando te juro 
Que te perdia se me encontravas 
E me encontrava se te perdias? 

Por que não voltas, mulher que passa? 
Por que não enches a minha vida? 
Por que não voltas, mulher querida 
Sempre perdida, nunca encontrada? 
Por que não voltas à minha vida 
Para o que sofro não ser desgraça? 

Meu Deus, eu quero a mulher que passa! 
Eu quero-a agora, sem mais demora 
A minha amada mulher que passa! 

No santo nome do teu martírio 
Do teu martírio que nunca cessa 
Meu Deus, eu quero, quero depressa 
A minha amada mulher que passa! 

Que fica e passa, que pacifica 
Que é tanto pura como devassa 
Que bóia leve como a cortiça 
E tem raízes como a fumaça. 

Vinicius de Moraes

Recado aos Amigos Distantes

Meus companheiros amados, 
não vos espero nem chamo: 
porque vou para outros lados. 
Mas é certo que vos amo. 

Nem sempre os que estão mais perto 
fazem melhor companhia. 
Mesmo com sol encoberto, 
todos sabem quando é dia. 

Pelo vosso campo imenso, 
vou cortando meus atalhos. 
Por vosso amor é que penso 
e me dou tantos trabalhos. 

Não condeneis, por enquanto, 
minha rebelde maneira. 
Para libertar-me tanto, 
fico vossa prisioneira. 

Por mais que longe pareça, 
ides na minha lembrança, 
ides na minha cabeça, 
valeis a minha Esperança. 

Cecília Meireles

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011



El Hombre Imaginario

El hombre imaginario
vive en una mansión imaginaria
rodeada de árboles imaginarios
a la orilla de un río imaginario

De los muros que son imaginarios
penden antiguos cuadros imaginarios
irreparables grietas imaginarias
que representan hechos imaginarios
ocurridos en mundos imaginarios
en lugares y tiempos imaginarios

Todas las tardes tardes imaginarias
sube las escaleras imaginarias
y se asoma al balcón imaginario
a mirar el paisaje imaginario
que consiste en un valle imaginario
circundado de cerros imaginarios

Sombras imaginarias
vienen por el camino imaginario
entonando canciones imaginarias
a la muerte del sol imaginario

Y en las noches de luna imaginaria
sueña con la mujer imaginaria
que le brindó su amor imaginario
vuelve a sentir ese mismo dolor
ese mismo placer imaginario
y vuelve a palpitar
el corazón del hombre imaginario.

Nicanor Parra

sábado, 3 de dezembro de 2011



Soneto LXIV

De tanto amor mi vida se tiñó de violeta
y fui de rumbo en rumbo como las aves ciegas
hasta llegar a tu ventana, amiga mía:
tú sentiste un rumor de corazón quebrado

y allí de la tinieblas me levanté a tu pecho,
sin ser y sin saber fui a la torre del trigo,
surgí para vivir entre tus manos,
me levanté del mar a tu alegría.

Nadie puede contar lo que te debo, es lúcido
lo que te debo, amor, y es como una raíz
natal de Araucanía, lo que te debo, amada.

Es sin duda estrellado todo lo que te debo,
lo que te debo es como el pozo de una zona silvestre
en donde guardó el tiempo relámpagos errantes.

Pablo Neruda

Entardecer na Praia da Luz

Espreguiçados, os ramos 
das palmeiras filtram 
a luz que sobra 
do dia. É já noite 
nas folhas. O branco 
das paredes recolhe 
o sangue e o vinho 
de buganvílias 
e hibiscos. Bebe-os 
de um trago: saberás 
que, mais do que cegueira, a noite 
é uma embriaguez perfeita. 

Albano Martins

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011


MÁGICO VIVIR

Arde aún y es espléndida la llama
de aquel fuego. ¿Recuerdas esas tardes,
el canto de los pájaros; la tenue
veladura de un mar casi tan negro
como tus ojos? Súbita, la vida
nos quemaba por vez primera entonces.
Nosotros, qué podíamos hacer
sino aceptar ese secreto incendio,
su agonía y su éxtasis, fundidos
en un mismo sentir inexpresable.
Hiere aún ese mágico vivir:
ya sólo quiero envejecer contigo.

Abelardo Linares


Boca

Boca viçosa, de perfume a lírio,
da límpida frescura da nevada,
boca de pompa grega, purpureada,
da majestade de um damasco assírio.

Boca para deleites e delírio
da volúpia carnal e alucinada,
boca de Arcanjo, tentadora e arqueada,
tentando Arcanjos na amplidão do Empírio,

boca de Ofélia morta sobre o lago,
dentre a auréola de luz do sonho vago
e os faunos leves do luar inquietos…

Estranha boca virginal, cheirosa,
boca de mirra e incensos, milagrosa
nos filtros e nos tóxicos secretos…

Cruz e Sousa

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011


A Disponibilidade de um Amor

a disponibilidade de um amor 
nasce numa cratera de deus 

anos antes, um pequeno corpo rochoso beijou 
a pele do pátio e um pequeno estrondo, tal suspiro 
saiu da sua boca, expirou 

a brisa, breve e quente 
esvoaça sobre os sulcos da terra 
e leva consigo uma espera 

hoje essa terra és tu 
e um amor disponível é a espera 
que espera algures por ti 

Jorge Reis-Sá

quarta-feira, 30 de novembro de 2011


Sentes, Pensas 
e Sabes que Pensas e Sentes

Dizes-me: tu és mais alguma cousa 
Que uma pedra ou uma planta. 
Dizes-me: sentes, pensas e sabes 
Que pensas e sentes. 
Então as pedras escrevem versos? 
Então as plantas têm idéias sobre o mundo? 

Sim: há diferença. 
Mas não é a diferença que encontras; 
Porque o ter consciência não me obriga a ter teorias sobre as cousas: 
Só me obriga a ser consciente. 

Se sou mais que uma pedra ou uma planta? Não sei. 
Sou diferente. Não sei o que é mais ou menos. 

Ter consciência é mais que ter cor? 
Pode ser e pode não ser. 
Sei que é diferente apenas. 
Ninguém pode provar que é mais que só diferente. 

Sei que a pedra é a real, e que a planta existe. 
Sei isto porque elas existem. 
Sei isto porque os meus sentidos mo mostram. 
Sei que sou real também. 
Sei isto porque os meus sentidos mo mostram, 
Embora com menos clareza que me mostram a pedra e a planta. 
Não sei mais nada. 

Sim, escrevo versos, e a pedra não escreve versos. 
Sim, faço idéias sobre o mundo, e a planta nenhumas. 
Mas é que as pedras não são poetas, são pedras; 
E as plantas são plantas só, e não pensadores. 
Tanto posso dizer que sou superior a elas por isto, 

Como que sou inferior. 
Mas não digo isso: digo da pedra, "é uma pedra", 
Digo da planta, "é uma planta", 
Digo de mim, "sou eu". 
E não digo mais nada. Que mais há a dizer? 

Fernando Pessoa  (Alberto Caeiro)

segunda-feira, 28 de novembro de 2011


Se Me Esqueceres

Quero que saibas 
uma coisa. 

Sabes como é: 
se olho 
a lua de cristal, o ramo vermelho 
do lento outono à minha janela, 
se toco 
junto do lume 
a impalpável cinza 
ou o enrugado corpo da lenha, 
tudo me leva para ti, 
como se tudo o que existe, 
aromas, luz, metais, 
fosse pequenos barcos que navegam 
até às tuas ilhas que me esperam. 

Mas agora, 
se pouco a pouco me deixas de amar 
deixarei de te amar pouco a pouco. 

Se de súbito 
me esqueceres 
não me procures, 
porque já te terei esquecido. 

Se julgas que é vasto e louco 
o vento de bandeiras 
que passa pela minha vida 
e te resolves 
a deixar-me na margem 
do coração em que tenho raízes, 
pensa 
que nesse dia, 
a essa hora 
levantarei os braços 
e as minhas raízes sairão 
em busca de outra terra. 

Porém 
se todos os dias, 
a toda a hora, 
te sentes destinada a mim 
com doçura implacável, 
se todos os dias uma flor 
uma flor te sobe aos lábios à minha procura, 
ai meu amor, ai minha amada, 
em mim todo esse fogo se repete, 
em mim nada se apaga nem se esquece, 
o meu amor alimenta-se do teu amor, 
e enquanto viveres estará nos teus braços 
sem sair dos meus. 

Pablo Neruda

Después de la Lluvia

Por las floridas barrancas
Pasó anoche el aguacero
Y amaneció el limonero
Llorando estrellitas blancas.

Andan perdidos cencerros
Entre frescos yerbazales,
Y pasan las invernales
Neblinas, borrando cerros.

Alfredo Espino